Eleito por uma margem menor do que 1% dos votos, Pedro Castillo buscou em toda campanha se distanciar das ideias maoístas que sustentaram boa parte dos seus apoiadores políticos. Seu plano de governo entretanto segue uma a uma as ideias centrais do “bolivarianismo” no continente.
Uma disputa entre “um professor e a filha de um ditador”, como mostrava a manchete da Globo News no programa “Em Pauta”, tem potencial para alterar os rumos do continente.
De fato, Keiko Fujimori é filha, e herdeira política, do ditador que governou o Peru durante toda a década de 90. Pedro Castillo, seu opositor, porém, está um tanto quanto distante de se destacar pela carreira acadêmica
De fato, Castillo foi por boa parte da vida um líder sindical e político. Trata-se do candidato do partido “Peru Livre”, que a despeito do nome, carrega um viés de esquerda conservadora.
Castillo é pró-familia, contrário a ideologia de gênero, a favor de que casamento se restrinja a homens e mulheres e contrário a toda agenda progressista que define os “liberais” americanos. Ao mesmo tempo é favorável a intervenção econômica pesada, de inspiração Maoista na economia.
Em suma, o Livre em seu partido cumpre uma figura decorativa como a palavra “Democrática” em República Democrática Popular na Coreia do Norte.
Para combater o Neoliberalismo e suas “depreciações”, como o homossexualismo, Castillo pretende jogar duro pelos interesses nacionalistas peruanos, e a despeito de buscar uma melhora na própria imagem, como Chávez em 1998, não se acanha em manter no programa de governo ideias como essas resumidas abaixo:
Nacionalização das empresas de gás, petróleo, comunicação e mineração
Poucos setores se tornaram tão anacrônicos quanto o petróleo e gás nas duas últimas décadas ao redor do mundo. Companhias da área têm sido penalizadas pelo seu efeito nocivo ao planeta e contribuição para o aquecimento global.
Enquanto o mundo caminha para uma descarbonização entretanto, Castillo retoma ao melhor estilo Getulista a campanha “O petróleo é nosso”, com seu projeto de governo defendendo revisão de contratos de exploração e produção e aumento na participação do governo nos lucros.
De fato, a produção de petróleo do Peru é pouco relevante, com cerca de 40 mil barris/dia, ou 1.3% da produção brasileira. Neste caso, o discurso possui um efeito mais político do que prático.
Sendo o segundo maior produtor de cobre o planeta, o setor de mineração possui um peso relevante na economia local. Ao menos 7% do PIB peruano deriva da produção mineral, além de 22% da pauta de exportações.
Em resumo, a mineração no país está nas mãos de grandes conglomerados globais, como Xstrata, Rio Tinto e a brasileira Vale.
Durante o segundo turno das eleições entretanto, Castillo tem negado que queira “estatizar” as companhias do setor, bem como outros da área de infraestrutura. Segundo o próprio, sua ideia é que o lucro seja destinado a investimentos no próprio país.
Na prática entretanto, a decisão deve forçar a nacionalização de companhias, seja pelo Estado peruano, ou por grupos de interesses locais.
Regulação da mídia
Em um setor onde direitos fundamentais como liberdade de expressão se misturam com questões econômicas, o presidente eleito deve atuar mais fortemente do aqueles que o antecederam.
Segundo trecho do programa do partido, a regulação da mídia deve ser a maior das batalhas enfrentadas em seu governo, e tem por objetivo resgatar os valores de “Lenin e Fidel”.
Os dois principais grupos de mídia local, a América Television e Grupo ATV, são de propriedade de empresas Mexicanas, sendo a primeira do grupo Televisa. A propriedade de veículos por estrangeiros está no cerne do embate enfrentado pelo novo presidente.
Sua inspiração leninista e em Fidel entretanto demonstra que a ideia de regulação está bem mais ligada ao domínio sobre o conteúdo do que propriamente ao controle acionário.
Auditoria na dívida
Como outros países da região, o Peru também deve embarcar em uma “auditoria da dívida”, ainda que a dívida pública no país seja relativamente baixa, em torno de 27% do PIB, e boa parte atrelada ao dólar, com juros baixos.
Sua proposta é de que a dívida externa seja renegociada ou cancelada, sob a justificativa de focar no pagamento da dívida interna, ou, uma outra dívida defendida por ele, a “dívida social com os trabalhadores”.
Renegociar dívida externa não tem sido algo difícil para os países latino-americanos. De fato, o Equador foi bastante bem sucedido na sua negociação, dado que ofereceu duas alternativas aos credores: receber 0 ou aceitar renegociar e receber 30%.
Em suma, um calote negociado é um caminho possível. Para boa parte dos investidores estrangeiros seria um caminho para sair do país. Uma alternativa que casa bem com a ascensão de um governo que renega investimento estrangeiro.
O problema, claro, é que ao promover este ajuste Castillo exclui o país de qualquer mercado global de dívida, fazendo com que no longo prazo os juros sejam maiores e o país não consiga importar poupança externa, dependendo apenas de si para investir.
Em um momento no qual os juros do planeta estão próximos de 0, recusar qualquer injeção de recursos global parece uma atitude um tanto quanto insana.
No momento histórico de maior liquidez global, Castillo fecha o país, a exemplo do Brasil que, no início da década, passou ao menos 5 anos sem novos leilões de campos de petróleo enquanto o barril atingia seu ápice.
Salário máximo
Diminuir a desigualdade na marra, por meio de leis, não é lá uma ideia muito nova. A própria defesa de Castillo e seu partido de que o salário de executivos seja limitado a 20 vezes o salário mínimo das empresas que estes comandam, já foi votada (e rejeitada), em países como a Suíça.
No caso Suíço, onde o salário mínimo está em R$25 mil/mês, em locais como Genebra, a proposta (apresentada pela juventude socialista local), foi rejeitada por 65/35%.
No Peru entretanto, Castillo deve ter boa base política no parlamento para implementar a ideia.
Propostas similares já foram apresentadas na Espanha, Grã Bretenha, Estados Unidos, México e no Chile. Com a eleição de Castillo porém, o Peru pode se tornar o primeiro país do mundo a adotar um salário máximo.
Imposto sobre lucro das multinacionais: 70-80%
Impostos sobre o lucro tem sido, ao longo das últimas décadas, uma obsessão comum de partidos mais à esquerda.
Em países mais progressistas, como Suécia ou Finlândia, aos quais Castillo e a esquerda latino-americana não se filiam, a questão mudou de tom ao menos desde os anos 90.
Na Suécia, por exemplo, o imposto sobre o lucro das empresas está em 21%, contra 34% no Brasil e até bem pouco tempo 42% nos Estados Unidos (e 26% após a reforma de Trump).
A lógica é de que ao taxar menos os lucros, e mais os dividendos (coisa que o Brasil não aplica), se permite que as empresas invistam mais, gerando assim mais empregos.
No caso peruano entrando, a discussão vai além de um imposto sobre dividendos, e se dá em cima do próprio lucro.
A decisão de taxar 70 a 80% do lucro em determinados setores torna, em muitos casos, o investimento externo inviável.
Em suma, Castillo pretende se distanciar da imagem de Chavez, mas as consequências de suas ideias o aproximam bastante do líder bolivariano falecido em 2013.
Muito mais do que as palavras, sempre doces em época de eleição, como as do próprio Chavez quando foi candidato, é importante olhar além, e buscar as consequências.
No caso de Castillo as consequências são claras. Reviver uma a uma todas as ideias que fracassaram no continente ao longo dos últimos 60 anos.
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