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Economia

3 histórias sobre o Brasil. Este é o risco de imprimir dinheiro

“A burrice no Brasil tem um passado brilhante e um futuro promissor” – Roberto Campos

Em junho de 1961, o economista institucionalista Douglass North fez uma visita ao Brasil por três semanas. Enviado pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos, buscava avaliar e discutir a qualidade do ensino da ciência econômica no país. Apesar disso, o real motivo era encontrar possíveis think tanks que propagassem a democracia liberal pela América Latina, evitando, assim, que surpresas soviéticas brotassem no quintal norte-americano.

Naquele momento de nossa história como nação, estávamos gestando uma das maiores desvalorizações monetárias já observadas no universo conhecido. O governo JK havia acabado cinco meses atrás, Jânio Quadros era o nosso presidente e João Goulart o nosso vice. Estávamos há três anos de um golpe militar que moldaria gerações e marcaria para sempre a economia e as instituições de nosso país.

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Em meio ao caos geopolítico mundial, Douglass North passeava pela cidade do Recife e se encaminhava para um encontro com Celso Furtado, então presidente da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE).

Antes de encontrar Furtado, porém, escreveu em seu diário um diagnóstico preciso do que parece ser a grande doença econômica brasileira: “Dirigindo pela cidade, vejo uma linda praia rodeada de adensamentos residenciais e comerciais bem pobres, com massas de desempregados e subempregados”.

O encontro ocorreu e os dois economistas concordaram em tantos pontos que Douglass North acreditou que Furtado estava apenas sendo cínico ou educado. North voltaria aos Estados Unidos e recomendaria investimentos no IBRE/FGV. Já Furtado permaneceria no Brasil e, para sua frustração, observaria que é impossível reduzir desigualdade social sem antes consertar a moeda circulante na economia.

O breve encontro ilustra perfeitamente o tema deste texto. Aqui vamos contar três histórias, sobre as quais você realmente deveria perguntar aos seus pais durante a quarentena, a respeito de como nosso vício em inflação nos transformou no eterno “país do futuro”.

Claro que é muito difícil selecionar apenas três histórias inflacionistas. O Brasil é um prato cheio de caos social e políticas econômicas desastrosas. Via de regra, seguimos a América Latina e estamos fadados a incorrer em populismos econômicos que, ao primeiro sinal iminente de falha, buscam remédios milagrosos e curas esotéricas. Mas a verdade é uma só, e muito bem sintetizada por Pedro Malan, ex-ministro da fazenda: No Brasil, o futuro é duvidoso e o passado é incerto.

Milagre Econômico

“O Milagre da Produtividade: Deus é brasileiro, é carioca, é funcionário do Estado e é agente fiscal!” – afirmava ao Jornal do Brasil um “fiscal” que havia acabado de ganhar um bônus de produtividade por seu trabalho. Nada resume melhor o que foi o Milagre Econômico de Delfim Netto do que um “fiscal”, sem qualquer especificação sobre o que fiscalizava, receber um aumento em meio a um dos maiores erros de política econômica na história do Brasil.

A história do Milagre começa com o Programa de Ação Econômica do Governo (PAEG). Ele foi implementado no começo da ditadura, trazendo medidas de cunho ortodoxo que reduziram inflação, o déficit fiscal e a emissão de moeda, além de corrigir algumas distorções tributárias. Políticas Econômicas acertadas no Brasil, no entanto, parecem apenas desculpas para incorrer em devaneios inflacionistas pouco tempo depois.

E foi exatamente isso o que aconteceu quando o 1º Choque do Petróleo atingiu o Brasil em 1973. Emílio Garrastazu Médici, então ditador do Brasil, viu-se obrigado a escolher entre duas soluções para a crise externa: i) Continuar as reformas ortodoxas e tentar corrigir a trajetória inflacionária da moeda; ou ii) Gastar, se endividar e criar infraestrutura por meio da inflação.

E foi construindo a TransAmazônica, Itaipú e a Ponte Rio-Niterói que o governo militar optou por destruir a terceira moeda brasileira e inaugurar os Planos Nacionais de Desenvolvimento I e II, os famosos PNDs. Foi nessa época que o regime decidiu massificar a corrupção ao criar 231 novas empresas públicas, desmembrando a Vale do Rio Doce e a Petrobrás em imensos conglomerados com diversas subsidiárias.

Apesar da cortina de fumaça da ditadura, alguns casos de corrupção, como os superfaturamentos da Odebrecht em Angra I e II, ganharam a mídia internacional e chegaram a ser denunciados pela revista alemã Der Spiegel. A construtora, que começou o regime como uma pequena empreiteira local, apresentaria o segundo maior faturamento do país em 1979, ao diversificar seus nefastos conluios com o Estado ao setor petroquímico.

Em 1985, a Ditadura Militar acabou, mas, incorrendo em clichês, as consequências econômicas lúgubres do regime são observadas até hoje. E a primeira delas caiu no colo de um maranhense extremamente culto.

Os Fiscais do Sarney e a Hiperinflação Inercial

José Sarney se formou em Direito em 1953 e adentrou a cena de emergentes poetas maranhenses no auge do Realismo Mágico latino-americano. Como no Brasil a maioria das pessoas não gosta de poesia, Sarney acabou se tornando Deputado Federal pela UDN em 1958. Durante a Ditadura, escondeu-se na ARENA e, por meio da diverticulite, assumiu a presidência de um país completamente dilacerado em 1985.

Sarney assumia o Brasil no 5º ano consecutivo de inflação anual acima de 100%. Na verdade, o Brasil enfrentaria quinze anos seguidos de inflação acumulada maior que 100%. Pense dois segundos sobre o que isso significa: se você guardasse em seu colchão o seu 13º, ele perderia metade de seu poder de compra até o Natal seguinte. E isso apenas se analisarmos em média, porque, em alguns momentos, a inflação alcançava inacreditáveis 42% mensais.

E foi tentando consertar a moeda que José incubiu João Sayad de promover uma saída heterodoxa para o problema inflacionário. Assim nascia o Plano Cruzado, três zeros a menos aqui, congelamento amplo de preços por doze meses acolá, algumas pitadas de reajuste salarial automático sempre que a inflação atingisse ou ultrapasse 20%, e pronto! A receita para o desastre já estava no forno e seria servida a qualquer momento.

O plano não deu certo, mas não foi por falta de tentativa. Já que ressuscitando no melhor espírito ufanista de que “Deus é Agente Fiscal”, Sarney decidiu convocar o que ficou batizado popularmente de: “Fiscais do Sarney”. Recriando à moda brasileira o dilema regulatório: “Who Watches the Watchmen”, todo e qualquer cidadão que observasse um supermercado aumentando o preço de seus produtos, e furando o congelamento, poderia denunciar ao governo a prática e restaurar um ininteligível equilíbrio econômico.

Mas o sistema de preços é algo inerente à vida em sociedade e, não adiantava subverter seu funcionamento, porque as consequências de qualquer intervenção desta magnitude sempre serão implacáveis. O governo do poeta se encerraria em 1990. O Brasil estava sem reservas internacionais, havia declarado uma moratória em 1987, estava com uma inflação galopante, em um crescimento econômico insustentável e às vésperas de escolher um presidente pela primeira vez em trinta anos.

O confisco da poupança

Retomando a desvalorização da moeda como uma visão de Estado, tem início o governo de Fernando Collor de Mello. Apesar de prometer em campanha uma agenda liberal de abertura econômica, privatizações de estatais e caça aos marajás, Fernando traumatizou uma geração de brasileiros ao determinar o confisco da poupança em seu Plano Collor I.

Tudo começou como sempre começava: completa mudança da equipe econômica, alteração do nome da moeda circulante e corte na quantidade de zeros. No dia 16 de Março de 1990, Zélia Cardoso de Mello, então Ministra da Fazenda, determinou que 80% de todos os depósitos do overnight que excedessem NCz$ 50.000,00 fossem congelados por dezoito meses. A medida era uma tentativa desesperada de conter a hiperinflação que corroía o poder de compra e o futuro dos brasileiros.

Não deu certo. E não deu pelo que talvez seja a história mais surreal de toda a economia brasileira: o Brasil não tinha um Banco Central, propriamente dito, em 1991. A Base Monetária poderia ser expandida, sem um controle centralizado, por qualquer banco estadual. Qualquer ente federativo poderia emitir a própria dívida, ao invés de recorrer ao Tesouro Nacional e solicitar recuperação fiscal.

Com a novela em andamento, e nenhum esforço político de um Presidente da República que caminhava para o seu próprio impeachment, o brasileiro observou inerte a inflação anual de 1993 alcançar 2.447,15%. Não existem analogias palpáveis para compreender o que é vivenciar uma inflação de mais de dois mil por cento ao ano. Não há patrimônio que aguente quando o Brasil decide ser o Brasil.

O preço de nascer brasileiro

Em 1994, após o impeachment e o governo interino, veio a estabilização da moeda. O Real, ao seu modo, curou o Brasil da hiperinflação. No entanto, o problema institucional gerado por essa ferida é incurável no curto e no médio prazos.

A realidade é que a hiperinflação não corroeu apenas o patrimônio de sua família durante quinze anos. O problema inflacionário corroeu a sensibilidade do brasileiro em perceber de forma acurada fenômenos de encarecimento generalizado nos preços.

Possivelmente, o melhor exemplo disso é a crença popular que o Real estabilizou a inflação e que nós, brasileiros, não temos mais que lidar com esse problema. A melhor e mais estável moeda brasileira já sofreu 452,9% de inflação nos últimos 26 anos. O Dólar, mesmo sendo uma moeda fiduciária, precisou de mais de 50 anos para produzir a mesma quantidade de inflação. Já o Bitcoin, por exemplo, jamais conseguirá gerar essa quantidade inflação.

Na verdade, não existe forma melhor de visualizar a história monetária brasileira do que realizar a conversão monetária entre um cruzado, quando foi concebido em 1942, e um real, em seu valor de 2013, antes de vivenciarmos um novo ciclo inflacionário: R$ 1 = Cr$ 2.750.000.000.000.000,00.

Esse é o verdadeiro preço de nascer brasileiro e se expor às nossas moedas e políticas econômicas no longo prazo.

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