Nick Taylor têm um trabalho pouco usual. Seu poder de comunicação e suas tiradas rápidas, tornam-o um dos principais responsáveis por defender um direito cada vez mais atacado em uma América preocupada com saúde e bem-estar, o de fumar.
É com este plot que “Thank you for Smoking” (Obrigado por fumar), filme de 2005 e financiado por Elon Musk e Peter Thiel (ambos originários do PayPal), discute um dos temas mais relevantes dos Estados Unidos na atualidade: o lobby.
Veja bem. Se por aqui a ideia de lobby está associada a açougueiros caipiras que financiam 1800 políticos em troca de subsídio para concentrar mercado, por lá, a atividade não apenas é legal, como permeia praticamente toda a economia.
Seja no setor de energia, na indústria farmacêutica ou nas redes sociais. É praticamente impossível encontrar uma grande empresa americana que não possua escritórios contratados em Washington prontos para defender seus interesses junto aos legisladores.
Por ironia do destino porém, Musk se tornou ele próprio um dos mais árduos defensores de medidas lobistas, afinal, mesmo sendo um gênio, playboy, bilionário e filantropo, Tony Stark, ou melhor, Elon Musk, também precisa manter seus negócios de pé.
Graças ao DAFA, ou “Driving America Forward Act”, o modelo 3 da Tesla, cujo preço está em $37.500, pôde sair de fábrica sendo vendido por $30.000, com o restante sendo custeado pelo generoso contribuinte americano via “Crédito tributário”.
Trata-se de uma medida com caráter limitado às primeiras 200 mil unidades (feito já atingido pela Tesla e pela GM). Deste patamar em diante, o subsídio tende a cair, fato que levou ambos, da velha e da nova indústria automotiva a unirem forças em prol do lobby para manter os subsídios.
Pode-se argumentar ainda que sua outra empresa, a SpaceX, também seja consequência de um forte subsídio estatal, em especial graças aos contratos vindos da NASA, responsável por alugar o próprio espaço de lançamentos de foguetes ocupado pela empresa (a despeito do lobby feito por outro bilionário da exploração espacial, Jeff Bezos, para impedir o contrato).
Essa entretanto é apenas uma das facetas que permeiam os negócios daquele que se tornou recentemente o 7º homem mais rico do mundo (posto que curiosamente já foi ocupado por Eike Batista).
É inegável que Musk seja um empreendedor serial e alguém capaz de revolucionar diversos setores. Graças a “Musk economics”, o custo de enviar objetos para a órbita terrestre caiu incríveis 90%, tornando possível sonhar com a colonização de Marte, algo até então restrito a futuros utópicos (ou distópicos) de ficções Asimovianas.
Quando aplicada a Tesla, sua organização econômica, uma espécie de “Toyotismo moderno” (em referência ao modelo implementado pela montadora japonesa que superou o Fordismo), também contribui para garantir que carros elétricos se tornassem uma realidade comum, com o fim do motor a combustão sendo apenas questão de tempo.
Sua atuação porém não está isolada em um ponto fora da curva na história, ou limitada aos subsídios, ao contrário, é parte de um processo que ocorre justamente pelo momento histórico em que vivemos.
Ao anunciar que estaria próximo a chegar ao sonhado estágio 5, no qual os carros se tornam completamente autônomos, Musk coroou um Rally que elevou o preço das ações da Tesla em mais de 200% no ano.
Tal “Rally”, como chamamos a corrida que eleva rapidamente o preço de uma ação, ocorre há alguns também patrocinado por fatores diversos.
Se antes da Pandemia o crescimento do mercado acionário americano via na economia em pleno emprego uma justificativa razoável para sua alta, no momento atual, a justificativa mudou, apesar de a consequência seguir a mesma.
Como Ray Dalio comentou recentemente, o lema do mercado no momento segue sendo “Cash is Trash”, pois apesar da corrida momentânea por liquidez, só há uma certeza diante daquilo que se tem feito para combater a brutal recessão da economia: seu dinheiro vai valer menos.
Com trilhões de dólares “imprimidos digitalmente”, pelo Federal Reserve, o banco central americano, a tendência é que um questionamento se torne cada vez mais evidente: qual o valor de um ativo (o dólar), que pode ser criado infinitamente?
Com essas questões em mente, o mercado tem agido para premiar aqueles que se sobressaem na inovação, criando novas tecnologias ou produtos. Ainda assim, isso é apenas parte da história.
Pelo caminho também, tem surgido uma série de negócios cujo valor em si é não apenas questionável, como por vezes danoso.
Ao se intitular como uma “Tech Company”, o WeWork chegou a atingir um valor de $47 bilhões. Isso porquê, ações de empresas de tecnologia tem sido o alvo preferencial de quem quer trocar dinheiro a juro zero por promessas de retornos futuros.
Na última década a Netflix chegou a se valorizar 2200%, ainda que não tenha atingido qualquer lucro. Dezenas de empresas se tornaram unicórnios e foram avaliadas em bilhões, ou mesmo dezenas de bilhões, sem que representem um modelo sustentável.
Nada disso porém é coincidência. Quando o dinheiro vale pouco, o retorno pode esperar, afinal, o custo de errar é cada vez menor.
Com essa lógica, o Vision Fund, liderado pelo Softbank, levantou mais de $100 bilhões, e fez jorrar recursos em empresas como a Uber e o próprio WeWork. Se no começo da captação o CEO do grupo Masayoshi Son previa investir em “inteligência artificial” e outras “tecnologias futuristas”, na prática, seus recursos inundaram modelos da chamada economia do compartilhamento (como o Rappi, Uber etc), cujo inovação não é exatamente o que se espera de uma tecnologia “futurista”.
Entre colonizar Marte ou colocar um garoto para ir de bicicleta comprar algo no mercado pra você, há uma distância um tanto quanto “gritante”.
Essas duas faces de um mundo onde o dinheiro vale cada vez menos se cruzam, e interagem diretamente com você.
Seja pelos produtos e serviços subsidiados como aquele cupom do Ifood (que você provavelmente nunca consegue usar porque só está disponível às 17h32 min de uma quinta-feira chuvosa em um restaurante específico), ou pela maneira como irão afetar sua produtividade futura.
O problema, como comentou Warren Buffett, que acaba de ser ultrapassado por Musk no ranking de bilionários Forbes, é o seguinte:
Imagine que você estivesse em 1915 e tivesse a grande oportunidade de investir em uma indústria nascente e revolucionária: a indústria de automóveis.
Caso decidisse fazer isso, você teria a sua disposição nada menos do que 2000 empresas. Como escolher a certa? Essa é a questão que fez Buffett se afastar das ações das chamadas “ponto.com”. Sua resposta foi dada em relação a um questionamento feito em 1997, quando o mercado se questionava se o “oráculo de Omaha” havia perdido seu toque.
Buffett passou ileso pelo estouro da bolha, e como ele próprio havia “previsto”, poucas empresas sobreviveram aquela bolha, incluindo as 4 empresas mais valiosas do mundo hoje: Apple, Microsoft, Amazon e Google, sendo as duas últimas originárias justamente durante esta bolha.
Caso tivesse investido no eBay, a grande estrela da época e responsável por comprar o PayPal de Musk e Thiel, Buffett teria na realidade perdido dinheiro.
Hoje, enquanto se senta em uma montanha de $50 bilhões em ações da Apple, adquiridas nos últimos anos, Buffett é novamente questionado.
Seu conselho porém segue mais vivo do que nunca: quem irá sobreviver?
Convenhamos, manter seu consumo de música subsidiado pelos prejuízos do Spotify não é algo que irá durar para sempre. Mesmo seu pedido no UberEats pode estar ameaçado quando a realidade bater a porta.
Duvidar que a realidade vá cobrar seu preço porém, não é algo viável. Como outro boom de empresas de “tecnologia”, o dos anos 30, que deu origem a boa parte da indústria de aviação americana mostrou, o fato é que aquilo que se têm hoje é um modelo regado de artificialidade.
Neste cenário futuro, talvez próximo, pouco importa que a família real Saudita tenha $2 trilhões em patrimônio, ela não vai continuar bancando o fundo de Masa Son para lhe entregar cupons pra passear com seu cachorro ou comprar hambúrguer subsidiado.
No fim, porém, grandes avanços irão sair deste cenário. A despeito de valer mais que boa parte da indústria de automóveis somada, a Tesla de Musk agrega seu valor, assim como a SpaceX. A pergunta que se deve fazer é outra: quanto realmente ela está agregando?
Quando a farra do juro zero acabar, é essa resposta que você irá torcer pra ter descoberto.
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