Antes dos anos 2000, “entrar na internet” era uma atividade que poderia ser dividida em etapas e que dependia de uma lista de pré-requisitos. CD-ROMs de instalação, modem externo, pacotes de horas contratadas com um provedor de serviço, conectividade a um provedor de acesso, liberação da linha telefônica, etc.
Poucos anos depois, a evolução natural dos softwares e dos hardwares envolvidos na atividade tornou tudo isso obsoleto. Houve o advento da banda larga e do acesso móvel, de tal forma que a popularização deles tornou a expressão vazia de sentido. Não mais “entramos na internet”, pois estamos nela a todo momento.
As moedas digitais parecem passar por uma transição similar. Há diversos indícios, inclusive, de que estamos exatamente no meio desse processo. Se hoje configurar uma carteira de bitcoins de forma segura ainda exige algumas etapas, trata-se de algo muito menos complexo do que no passado recente. Em poucos anos, contudo, navegar na web deverá se tornar indissociável de usar criptoativos.
BRAVE: NAVEGADOR COM RECOMPENSAS
A Brave Software foi fundada por Brendan Eich, criador do Javascript e antigo CEO da Mozilla (responsável pelo famoso browser Firefox). Em 2016, a empresa lançou a primeira versão do navegador web Brave. Mas por que mais um navegador, se boa parte dos usuários já superou o Internet Explorer e parecia bem com o Google Chrome ou o Mozilla Firefox? Privacidade e recompensas financeiras.
Essas são as palavras-chave para entender o Brave e o ecossistema que se pretende construir em torno dele, a partir do uso de criptoativos. O browser surge como resposta às crescentes ameaças à privacidade de dados na web.
Disponível para desktops e smartphones, ele vem com um bloqueador nativo de anúncios e de compartilhamento de dados, além de uma carteira de moedas digitais embutida. Essas funcionalidades eram até então praticamente inexistentes para a grande maioria de usuários nos sistemas Android e iOS.
O aplicativo é integralmente gratuito e composto por software livre, tendo seu código derivado do browser Chromium, que também é a base do Google Chrome. Isso torna a navegação no Brave bem próxima à do irmão famoso. O diferencial é que nele seus dados pessoais não são compartilhados com empresas privadas a troco de nada (e usualmente sem seu consentimento explícito).
Há um programa de recompensas financeiras denominado Brave Rewards. Lançado ao público em abril de 2019, ele consiste numa via de mão dupla e de fácil utilização.
Para o usuário comum, ao acessar alguns de seus sites de preferência, é possível optar pela visualização de anúncios direcionados, sem a necessidade de compartilhar externamente dados e preferências de uso. Como forma de “pagar” pela atenção dispendida, o navegador paga uma recompensa diretamente em moeda digital.
Por sua vez, também é possível ao usuário doar recursos na forma de moedas digitais diretamente às páginas que mais visita, como forma de estimular a manutenção e a criação de conteúdo. Em resumo, o que o Brave começa a fazer, ainda de forma experimental, é estruturar o que pode ser o futuro da web.
Customização, domínio do usuário sobre seus dados pessoais e micropagamentos viabilizados por criptoativos como forma de remunerar criadores de conteúdos. Uma rede mais descentralizada, menos dependente do marketing intrusivo e com modelos de negócio que combinam inovação e flexibilidade.
Essa visão de futuro, somada a uma boa dose da especulação característica do período, foi o que levou o Basic Attention Token (BAT) a captar 35 milhões de dólares em menos de 30 segundos, durante oferta pública inicial (ICO) em maio de 2017. Trata-se da moeda digital nativa inicialmente usada nesse esquema de recompensas mútuas entre espectadores e websites, tendo sido emitido 1 bilhão de unidades.
Os fluxos de envio e recebimento são automatizados a partir de uma wallet nativa integrada ao navegador. Uma vez que o usuário configure suas preferências de recebimento por anúncios e de doação por visita a sites, tudo é feito sem qualquer interação manual.
É possível ainda enviar e receber BATs a partir de uma wallet externa e todos têm a possibilidade de converter os tokens recebidos para bitcoins, dólares ou outras dezenas de opções sem sair do navegador. Por meio de parceria com a empresa Uphold, o Brave torna possível até mesmo sacar o valor em moeda nacional para uma conta corrente em seu nome.
FIREFOX TENTA DAR O TROCO
A Mozilla, com seu navegador Firefox, que já não é mais o mesmo em termos de sucesso entre o grande público, não quer deixar barato. Vendo o crescimento do Brave nos últimos meses, chegando à casa de 15 milhões de usuários ativos, também está mirando a privacidade de seus usuários.
Em parceria com a Scroll, foi lançada em março deste ano uma extensão para o Firefox chamada Better Web. Uma vez instalada no navegador, ela impede que seus dados de busca e histórico de acesso, bem como outras preferências, sejam indiscriminadamente compartilhados com terceiros, em especial anunciantes.
Se essa primeira funcionalidade é gratuita para todos, a polêmica, no entanto, surgiu diante da possibilidade de bloquear anúncios. O plugin Better Web permite fazer isso, mas apenas para usuários interessados em pagar 5 dólares ao mês para ativar o recurso, além de só estar disponível para alguns sites e ser limitada a usuários norte-americanos. Embora o dinheiro vá em boa parte para os criadores de conteúdo, ele terá que sair sempre do bolso do usuário, já que não há qualquer mecanismo de recompensas.
Como se pode notar, trata-se de um produto experimental, a partir do qual a Mozilla quer fazer frente tanto a seus concorrentes quanto a sua missão de tornar a web melhor e mais aberta, assegurando a privacidade dos usuários. Entretanto, como até o momento o mercado de browsers não nos permite negar, a inovação trazida pelo Brave não tem rivais à altura, em especial por ser gratuita e funcionar em quase toda a internet.
Conforme explicado, uma peça central da solução construída por eles está na utilização de micropagamentos, os quais só se tornaram possíveis na escala e na forma desejadas a partir de criptoativos. O Brave optou por um sistema fortemente dependente de sua própria moeda digital: o BAT. Há quem veja nisso uma vantagem, por razões técnicas e econômicas, mas muitos criticam o projeto por ter criado um novo token, (na visão desses) apenas para conseguir captar dinheiro fácil no boom dos ICOs.
A versão inicial do projeto, conforme os primeiros pilotos do Brave evidenciaram ainda em 2016, utilizava o próprio Bitcoin como mecanismo financeiro. No entanto, se para a Brave razões comerciais parecem ter afastado a companhia das inovações mais recentes que permitem ao BTC funcionar em micropagamentos, players muito maiores estão de olho em tecnologias como a Lightning Network.
TWITTER APOSTA ALTO NA INTEGRAÇÃO DO BTC À WEB
Em especial por meio da figura de seu fundador Jack Dorsey, notório entusiasta do Bitcoin, a empresa vem dando passos importantes na integração dos criptoativos ao cotidiano do usuário médio de internet. Um dos maiores interesses da companhia, em torno do qual já há pilotos em curso, é permitir o pagamento de pequenas “gorjetas” na forma de micropagamentos em frações de BTC.
É como se a cada like ou retweet dado em um conteúdo, as pessoas pudessem manifestar financeiramente sua satisfação na rede social, inclusive como forma de incentivar a criação de novos conteúdos em formato similar. Não por acaso, há cerca de 2 anos, Dorsey vem apoiando diretamente os desenvolvimentos técnicos da Lightning Labs.
A startup é responsável por uma das principais implementações da Lightning Network, uma espécie de plugin que permite à rede Bitcoin saltar das dezenas para as dezenas de milhares de transações possíveis em um curto intervalo. Ou seja, mais do que o mero apoio, grandes nomes estão investindo milhões de dólares no avanço da infraestrutura que permitirá ao Bitcoin crescer na escala necessária para virar lugar comum nas aplicações web.
Outra empresa do portfólio de Jack Dorsey, a Square acumula patentes nesse sentido. Uma das mais recentes delas é para um sistema que permite converter automaticamente criptoativos como o BTC em moedas nacionais como o dólar, criando um gateway que torna o processo “invisível” para o cliente final.
Sem dúvidas, essa é uma funcionalidade que interessa não somente à fintech do CEO do Twitter. Todas as aplicações baseadas na web estão em vias de se transformar para sempre em menos tempo do que se imagina.
Embora muitos estejam alheios às radicais mudanças em curso, os grandes nomes da tecnologia já entenderam: muito mais do que o dinheiro da internet, o Bitcoin está se transformando na internet do dinheiro.
*Este texto não é uma recomendação de investimento.
Foto: dehub/Flickr
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