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Economia

Limitar os juros é a ideia mais anti-pobre do ano

“A primeira regra da economia é a escassez. A primeira regra da política é ignorar a primeira regra da economia”. Thomas Sowell Há mais ou menos 415 anos, Shakespeare apresentava uma de suas peças mais famosas, retratando a disputa entre Bassânio, um nobre falido, e Shylock, um agiota judeu.  Embarque em mais de 150 horas […]

A primeira regra da economia é a escassez. A primeira regra da política é ignorar a primeira regra da economia”. Thomas Sowell

Há mais ou menos 415 anos, Shakespeare apresentava uma de suas peças mais famosas, retratando a disputa entre Bassânio, um nobre falido, e Shylock, um agiota judeu. 

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Há inúmeras disputas e camadas em “O mercador de Veneza”, a começar pelo anti-semitismo sistêmico que reinava na Europa, e que é a base da proposta de Shylock como garantia ao empréstimo que faria ao nobre veneziano: um pedaço da sua pele seria arrancado caso deixasse de quitar sua dívida.

O final da história, como você já deve saber, é a solução encontrada pela amada de Bassanio, Pórcia, que disfarçada de advogado alega uma brecha no contrato: não há previsão de qualquer gota de sangue derramado, o que significa que se Shylock quiser cobrar sua dívida, não poderá derramar o sangue de Bassanio ao cortar sua pele.

Na prática, Shylock foi vítima daquilo que hoje conhecemos como “insegurança jurídica” (sim, eu sei que pra muita gente ele é o vilão da história).

No Brasil atual, para cada R$100 que algum tomador deixa de pagar em empréstimos, os emprestadores conseguem recuperar apenas R$14 ao tomarem as garantias.

Para a sorte dos ricos caloteiros como Bassanio, a mão amiga dos bancos públicos e um sistema jurídico inapto segue lhe ajudando.

Não bastasse isso, como o acordo da Caixa Econômica que deu a Eike Batista cerca de 40 anos para quitar as dívidas de uma de suas empresas falidas, os Bassanios atuais ainda possuem uma ajudinha em seus empréstimos, graças ao crédito direcionado. 

Nada menos do que 47% do crédito no país é pré-determinado por alguma lei. 

De quebra, Bassânio ainda contaria por aqui com ajuda de alguns políticos e suas soluções geniais, como Álvaro Dias e sua estúpida ideia de limitar os juros (algo que estava na Constituição Federal e foi retirado durante o governo Lula).

Mas deixando Shakespeare de lado, e sendo o mais direto possível, não há dúvidas de que nosso sistema financeiro é bastante concentrado, nossos bancos (públicos e privados), cobram juros absurdos e muitas pessoas sem educação financeira acabam se enrolando em dívidas.

Essa não é uma história porém entre “o bem e o mal”, ou uma população vítima de bancos cruéis.

Primeiro, é importante entender que essa concentração bancária não nasceu ao acaso.

Até 1994, o número de bancos no Brasil era relativamente alto, por uma razão bastante simples: você não precisava fazer nada para ganhar dinheiro com um banco.

Isso ocorre porque, bancos criam dinheiro. A cada R$100 depositados em um banco, eles podem emprestar R$800. Em tempos de hiperinflação, essa capacidade de criar grana do nada, virou uma farra. Todo governo estadual tinha seu banco para ajudar a financiar os gastos públicos.

Com o real, essa farra acabou. Mas não foi apenas isso. Em 1994, para evitar um aumento excessivo no crédito e no consumo (que pressionaria a inflação), o BC editou uma medida que obrigava os bancos a guardarem 100% dos depósitos feitos no caixa do BC, sem qualquer remuneração.

O resultado é que entre 1994 e 1999, o Banco Central interveio em 191 instituições, incluindo 54 bancos.

O fim da hiperinflação causou alívio a população, mas não sem um custo. A concentração bancária aumentou aos níveis atuais.

Nos anos seguintes, inúmeros bancos estrangeiros foram saindo do país, sendo vendidos aos poucos bancos nacionais que conseguiram sobreviver, ampliando seus empréstimos e serviços. Outros tantos bancos nacionais se fundiram.

Se antes do Real os bancos chegaram a lucrar 3% do PIB (R$180 bilhões em valores atuais), apenas com a inflação, nessa nova fase eles precisaram ampliar crédito e oferecer novos serviços para poder lucrar (e ainda hoje lucram menos do que naquela época).

Com uma taxa de poupança baixa, os novos serviços acabaram sendo direcionados a poucas pessoas, e precisavam cumprir alguns critérios, como a capacidade de dar garantias reais. 

Inúmeras alterações foram feitas neste período para melhorar o sistema, como a reforma de 2005 encabeçada por Marcos Lisboa, que elevou a taxa de recuperação de crédito para os atuais 14%. Ainda assim, bastante abaixo da média mundial, como você confere neste gráfico abaixo:

Durante este período o governo atuou também fortemente para criar linhas de crédito específicas, para agricultores ou o setor imobiliário. 

O problema, como relata a frase inicial deste texto, é que mesmo o dinheiro é escasso.

Se de cada R$100 em poupança que possa ser emprestada, R$47 (que eram R$56 em 2016), são direcionados para setores específicos, significa que todo o restante da população tem de disputar os outros R$53.

Como então ocorre essa disputa? Sabendo que a probabilidade de calote é elevada, que as garantias são baixas e que em metade do crédito a margem de lucro é extremamente baixa (para ajudar setores como agricultura ou imobiliário), os bancos, mesmo os públicos, repassam seus custos para aquela parte que sobra.

O resultado é que exceto que você consiga se enquadrar em algum tipo específico de empréstimo, você pagará juros bastante elevados, subsidiando de maneira indireta os que se beneficiam de linhas específicas.

Agora imagine que você não tenha qualquer garantia para dar em empréstimos. Pois é, essa é a situação de boa parte da camada mais pobre da população. 

Não há qualquer dúvida que entre a boa vontade de uma lei e a realidade, a disputa será vencida pela realidade.

Ao impedir que os custos cubram o risco, a incerteza de inadimplência chega a ⅓ do custo de empréstimo no Brasil, a medida a ser tomada pelos bancos será simplesmente não emprestar.

Como resolver essa situação porém, é um debate muito mais saudável e lógico. Se queremos impedir que os bancos tenham tanto poder sobre o mercado e coloquem seus custos elevados no lombo do tomador de empréstimos, o mais útil é ampliar a competição.

Por ampliar a competição porém, não estamos falando de mais bancos apenas. Seria utópico pensar que um grande banco internacional irá construir aqui uma base do zero e competir com os já estabelecidos.

O lógico portanto, é ampliar a existência de empresas que possa competir em setores específicos: as Fintechs.

Fintechs que ofereçam contas bancárias sem tarifas têm forçado bancos a oferecer pacotes de serviços mais baratos. Fintechs que ofereçam crédito com garantia em automóveis ou imóveis, tem levado a uma queda nos juros nessas áreas.

O motivo para isso é bastante simples: bancos são instituições enormes, com custos elevados e sujeitos a burocracias internas.

Nos últimos anos avançamos bastante, criando um cadastro positivo que garante informações aos bancos menores sobre os clientes, e ainda há em pauta a implementação do Open Banking.

Ambas são soluções na mesma linha: impedir que as informações de consumidores estejam restritas bancos com dezenas de milhões de clientes.

Isso significa que os bancos menores poderão ter mais informações e garantir empréstimos a clientes com bom histórico, elevando a competição.

A ideia de limitar os juros porém, segue o caminho oposto, ela faz com que grandes bancos possam se manter por meio de taxas e serviços e eliminem assim os pequenos, que sem informação ou um sistema jurídico que dê garantias, não conseguirão emprestar.

Um banco como o Itaú conseguirá fazer render sua área de Investimentos, e um banco como o Bradesco irá continuar lucrando uma boa grana na sua área de seguros e saúde, com dezenas de milhões de clientes, um banco pequeno porém, irá facilmente sair do mercado.

A conclusão aqui é simples: não devemos julgar o projeto, como nada que parta de uma mente iluminada em Brasília, pela sua proposta, mas pelas consequências que elas geram.

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