Félix Émile Borel foi um conceituado matemático francês, autor de uma série de obras e teoremas envolvendo probabilidade. Na cultura popular, Borel tornou-se famoso pelo seu “Teorema do macaco infinito”.
Segundo a ideia central do teorema, um macaco que esteja teclando infinitamente em uma máquina de escrever irá em algum momento escrever algo compreensível. A depender do número de vezes que teclar, é possível esperar que ele acabe por escrever até mesmo obras inteiras, como a obra de Shakespeare, por exemplo.
No mercado financeiro, brincadeiras com a aleatoriedade ganham um tom mais sarcástico, mas estão comumente presentes. Burton Malkiel escreveu em seu livro “A random walk down on Wall Street”, que “um macaco vendado jogando dardos nas páginas financeiras de um jornal, poderia se sair tão bem quanto um gestor”.
No Brasil por exemplo, a conta do Instagram “Monkey Stocks“, semanalmente escolhe ações do índice Bovespa para compor sua carteira. O resultado? Desde o começo, o macaquinho aleatório supera recomendações de conceituadas “Carteiras recomendadas”.
Em um evento um tanto quanto escatológico, mas também engraçado, um programa norueguês contrapôs gestores de ações a uma vaca, de nome Gullros, um time de astrólogos e dois blogueiros, para que pudessem escolher quais ações comporiam sua carteira.
Na visão dos gestores, que tiveram resultado similar ao da vaca (7,28% vs 7,26%), porém menor que o dos blogueiros (10%) seu retorno foi “muito menos volátil” (sim, os astrólogos ficaram em um último, pra surpresa de ninguém).
Em uma revelação curiosa porém, os apresentadores mostraram seu próprio resultado no final. Tiveram um ganho de 24%!
O truque entretanto, é que eles montaram 20 combinações distintas e apresentaram apenas o resultado mais promissor.
Tal questão levanta um alerta importante, segundo eles, para você que está decidido a investir com o gestor da moda: muitos fundos que performam abaixo do índice nos seus primeiros anos, costumam ser fechados, de modo que os gestores permaneçam apenas com os fundos que têm retornos robustos, portanto atraem mais atenção.
Tudo isso porém é bastante óbvio. Se superar o mercado, e não apenas pelo curto espaço de tempo dos experimentos envolvidos (afinal, não é razoável julgar um gestor pelo retorno de 3 meses), mas por uma razão mais simples ainda: se superar o mercado fosse uma tarefa fácil, os grandes gestores, como Warren Buffett, seriam apenas mais um nome de uma interminável lista.
O fato é que o glamour do mercado e suas histórias fascinantes de “grandes acertos” pode causar impressões erradas para quem está acostumado a pacata renda fixa. Justamente por isso, resumimos aqui alguns conselhos para lhe ajudar na transição da renda fixa para a renda variável.
Você provavelmente não é um gênio.
Bater o mercado é o grande mantra, além da regra mais importante para que um gestor acabe se destacando. Como você já deve ter sacado, isso não é nem de longe algo fácil.
No Brasil, como pontuou em 2015 o economista Pedro Mota, cerca de 74% dos fundos haviam performado abaixo do CDI, o indicador que serve de parâmetro para boa parte dos fundos.
Apenas 1 em cada 4 ofereceu aos seus investidores um retorno maior do que aquele que teriam se investissem em renda fixa.
A consistência, portanto, é algo que deve ser premiado, e o reconhecimento de inúmeros gestores deriva dela, e não de “jogadas geniais” que porventura se destaquem.
Não há por exemplo, uma jogada única que defina Luiz Barsi, o maior investidor pessoa física da Bovespa. Como próprio Barsi revela, sua carreira como investidor começou com um objetivo modesto: montar uma carteira de ações que lhe garantiria uma boa aposentadoria. Ao longo de décadas, reinvestiu os dividendos que recebeu, fazendo disso um multiplicador. A lição central de Barsi portanto é acima de tudo “paciência e tempo”.
Não parece tão glamuroso, correto? Essa é uma grande questão quando se trata de investimentos em bolsa. A ideia de que você vai ficar rico logo, acertando a ação perfeita e que irá subir indefinidamente ainda seduz bastante.
Não por coincidência, a complicada Oi, em processo de recuperação judicial, possui 1.209 milhão de acionistas, enquanto a WEG, uma das empresas mais “redondas” da bolsa, cujos resultados consecutivamente se mostram positivos, possui 219 mil.
Porquê alguém investiria em uma empresa em recuperação judicial, podendo investir em uma empresa cujos retornos positivos se acumulam ao longo de literalmente décadas? Quer um exemplo? Pegue a mesma WEG. Caso você tivesse investido R$50 em 1994, teria R$ 43 mil em 2018. Caso tivesse investido os mesmos R$50 em 2008, teria R$ 217 (um ganho de 430% em 1 década).
O motivo? Dentre outras questões, o fato de seu faturamento ter crescido 17% ao ano desde então.
Cabe lembrar, claro, um outro mantra do mercado: rentabilidade passada não é garantia de rentabilidade futura. Isso não significa porém, que os retornos se devam ao acaso. Empresas sólidas e com um histórico de entregas são, ainda, um passo importante para começar a investir.
Você não ficará rico escolhendo a ação da moda que irá explodir de um dia para o outro. E tudo bem.
Não se prenda a números mágicos
Com 2.4 milhões de CPFs, a Bolsa de valores brasileira tem se popularizado, com um salto de quase 4 vezes em relação a 2016.
Que o mercado acionário sempre foi visto como algo elitizado, porém, não chega a ser novidade, mas cabe lembrar que a ideia de que você ficará milionário na bolsa, e contas de padaria calculando quanto você precisa investir para chegar a R$1 milhão, ainda são bastante comuns.
Como convencer alguém a economizar R$100 por mês, se os especialistas e influencers estão por aí falando em “economizar R$500 por mês para atingir R$1 milhão”?
O fato é que a ideia central de qualquer destas contas é apenas uma: crescimento composto ao longo do tempo.
Na renda fixa você talvez tenha mais facilidade em enxergar essa questão, afinal, a ideia de juros está bastante arraigada. Em renda variável porém, os juros são menos perceptíveis.
O retorno das ações via de regra acompanha seu retorno em lucro, ficando em uma média de 10 vezes o lucro na bolsa como um todo (algumas empresas bem mais do que isso, outras bem menos, afinal, bolsa também é expectativa de crescimento).
Se a empresa reinveste os recursos e cresce, na prática ela está lhe entregando juros, afinal, seu pedaço em ações está valendo mais. Para melhorar, as empresas ainda distribuem parte do lucro em dividendos. Reinvestindo estes dividendos, você gera uma bola de neve que colabora da mesma maneira que os tais “juros compostos”.
Não é preciso se iludir achando que você precisa ter, ou buscar R$1 milhão para estar na bolsa. Definir objetivos pessoais já é um bom caminho. Mas ainda que você não tenha estes objetivos, convém lembrar que ter uma grana guardada lhe garante segurança em momentos ruins.
Seja com R$100 ou R$1000 por mês, investir é criar uma disciplina e facilitar sua vida no futuro.
Quanto mais cedo você começar, mais o seu eu do futuro vai lhe agradecer.
O peso do dólar na equação.
Como o próprio Barsi lembra, caso você tivesse investido $100 dólares em 1968, e acompanhasse o retorno do índice da bolsa, você chegaria a 2016 com $18 mil dólares, mais do que 10% ao ano em retorno em dólar.
Caso tivesse investido em 2008 porém, seu retorno em dólares seria decrescente.
A moeda americana é um fator importante, considerando o peso que investidores internacionais tem na bolsa, e sua inflação menor.
Neste sentido, convém tomar cuidado com os números nominais para não se iludir. De que adiantaria por exemplo ter um retorno de 10% se o seu poder de compra caiu 12%? Dinheiro, pra maioria das pessoas, é uma maneira de garantir segurança, não apenas um placar no jogo, portanto, seu valor deve estar compatível com seu poder de compra.
Uma boa maneira de se proteger dessa questão seria procurar investimentos no exterior. E eles são bem menos complicados do que parece. Ativos cotados em dólar, como ouro ou Bitcoin, estão disponíveis para investir no Brasil.
Diversificação importa. E muito
Em abril, publicamos aqui um resumo da estratégia de Nassim Taleb que fez o fundo assessorado por ele gerar retornos superiores a 3600% em março, no meio de uma queda generalizada. A ideia é simples: esteja preparado para o pior e reserve uma fração dos seus Investimentos para algo cujo valor possa se desprender e ter retornos extraordinários.
Em grandes momentos de incerteza, diversificação vira proteção. E foi assim que o Bitcoin, os Coronabonds e o Ouro apareceram novamente no holofote do mercado e da mídia especializada no mundo inteiro.
No entanto, algo engraçado aconteceu no Brasil. Considerando que acabamos de sair do 1º semestre de 2020, devem ter passado pelas suas redes sociais os retornos semestrais dos principais ativos negociados no país. A grande semelhança entre essas publicações? Quase todas ignoraram o Bitcoin.
O motivo? Basta observar os retornos. Nos últimos seis meses, o Ibovespa fez -19%, o CDI fez 2,5%, o Dólar alcançou alta de 32%, o Ouro fez invejáveis 52% e, o ativo que não pode ser mencionado, o Bitcoin, valorizou 72% frente ao Real.
Uma coisa porém deve estar clara. Quando falamos de proteção, convém lembrar que ela deva representar uma fração da sua carteira que comporte um risco maior. Cerca de 2-5%, como menciona Taleb (que caso você não saiba quem é, podemos resumir como “o guru dos gurus”).
Em um clima de bolsas inflando com uma ajuda do FED, o Banco Central americano, você talvez se sinta um gênio do mercado vendo a tela verde e os 100K do Ibov brilhar na tela, mas lembre-se, cautela nunca é demais.
Se você é um investidor tradicional da renda fixa, ou começou a investir comprando seu título no Tesouro Direto, a bolsa pode, e deve, lhe demandar um bom tempo de estudo, conferindo o que torna uma empresa sólida, ou não.
Mostre que seus pais estavam errados e que a ideia de “Cassino”, é apenas um erro comum, estimulado por grandes investidores fechados em seu mundinho e sem muita paciência de lhe ajudar a começar.
*Este artigo não é uma recomendação de investimento.
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